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Como jornalistas cidadãos sobrevivem na Síria

Depois de anos de conflito entre o presidente Bashar al-Assad, o Estado Islâmico (ISIS) e outros grupos de oposição e militantes, o Comitê para a Proteção dos Jornalistas classificou a Síria como o terceiro país mais letal para jornalistas.

Para a jornalista síria Zaina Erhaim, trabalhar em meio a esse perigo tornou-se uma rotina diária. Baseada em Aleppo, um dos principais locais da guerra civil síria, Zaina enfrenta a ameaça constante de ataques aéreos e sua segurança nunca é uma garantia — ainda assim ela continua a reportar sobre o conflito. Sua reportagem apareceu no EconomistGuardian e muitos outros veículos.

Como coordenadora do projeto Síria do Institute for War and Peace Reporting (IWPR), Zaina ensina dezenas de civis sírios as habilidades e estratégias necessárias para se tornarem jornalistas cidadãos, tudo sem nenhum custo para eles. Cerca de um terço das pessoas que ela ensina são mulheres. O trabalho de seus alunos já apareceu em publicações internacionais e ela ajudou-os a criar seus próprios meios de comunicação independentes.

Conversamos com Zaina pouco antes de ela aceitar o Prêmio Peter Mackler 2015 para o Jornalismo Corajoso e Ético em Washington.

IJNet: Como você descreveria o clima da mídia na Síria? Como está a situação para os jornalistas lá?

Zaina: Em primeiro lugar, não há jornalistas de verdade, dentro da definição tradicional. Não há mais nenhum, especialmente em áreas mantidas pela oposição, que são as áreas que estão sendo bombardeadas diariamente. Para um jornalista cidadão, é uma zona de guerra. É considerado um dos lugares mais perigosos para os jornalistas, então esta é a situação. Nesta sociedade, há muito deixado de lado, porque a maior parte do treinamento e maior parte do trabalho estão sendo feitos nos países vizinhos.

Ser jornalista sírio, como seria de se esperar, é algo muito mais diferente do que ser apenas um jornalista em uma zona de guerra. Para mim, aquelas pessoas que eu estou reportando são queridos amigos e membros da família. Porque você é um jornalista, é colocado na lista de procurados do regime, militares, Estado e força aérea, embora eu não saiba nem mesmo como andar de bicicleta.

IJNet: Você treinou mais de 100 jornalistas cidadãos na Síria. Que tipo de lições tenta ensiná-los durante os treinamentos?

Zaina: Muitas das pessoas que eu treino tornaram-se jornalistas cidadãos apenas por causa da falta de jornalistas, porque os jornalistas profissionais não poderiam fazê-lo para o país. Então o que eu estou tentando ensiná-los é principalmente como desenvolver as habilidades que ganham na prática, transformando em jornalismo de verdade. É principalmente o básico do jornalismo — como escrever notícias, como fazer uma reportagem, como reportar, como permanecer objetivo nestas circunstâncias — apenas valores jornalísticos muito gerais.

IJNet: O que você faz para se manter segura enquanto está reportando?

Zaina: Eu não posso fazer nada, porque a morte não é algo que você pode evitar lá. A principal fonte de morte é os ataques aéreos e não há nenhuma maneira de ignorar isso. Eles principalmente fazem os civis como alvo, por isso, mesmo se você evita todas as bases militares, isso não o protege de ser atingido. Então a única coisa que você pode fazer é só esperar não ser morto.

Eu também me lembro que fiz um treinamento quando o ISIS ainda estava na cidade de Aleppo, antes de ser expulso por rebeldes, que foi um dos treinamentos mais difíceis que eu já fiz. Naquela época, o ISIS começou a sequestrar jornalistas cidadãos que estavam trabalhando na cidade. Eles sequestraram três, e então nós decidimos que deveríamos estar ajudando aqueles que tinham ficado aqui, porque essas são as únicas fontes para informar sobre o que o ISIS estava fazendo. Então eu fiz o treinamento; tinha cerca de 10 jornalistas cidadãos. Eu disse às pessoas em pessoa na noite anterior onde o treinamento ia ser e pedi para não trazerem câmera e não irem sozinhos no caso de serem sequestrados. São todas essas coisas que você tem que colocar em perspectiva.

IJNet: Você fez artigos como o seu perfil sobre mulheres sírias que provavelmente não teriam sido possíveis se um homem tivesse tentado escrever. Ser uma mulher jornalista tem um impacto sobre o seu trabalho?

Zaina: Sim, definitivamente. A maioria das áreas do norte da Síria é considerada conservadora. Eles não estão acostumados a ver mulheres fazendo trabalho de rua como jornalismo, portanto apenas ser mulher é algo que não esperam. Ser uma mulher com uma câmera é algo que chama muita atenção e atenção nestas circunstâncias não é algo bom. Há muitos espaços que não posso acessar, porque eu sou uma jornalista mulher. Mas, por outro lado, ser uma mulher jornalista me deu a chance de entrar em algumas casas que os meus colegas do sexo masculino não poderiam entrar e alguns espaços que nenhum jornalista cidadão do sexo masculino seria capaz de entrar ou cobrir, por isso tem alguns prós e contras.

IJNet: Agora, o jornalismo cidadão é a única maneira de cobrir o que está acontecendo na Síria. Você vê a situação ficando melhor para os jornalistas ou civis?

Zaina: Está ficando pior para todos. Para os civis, para jornalistas cidadãos, para todos aqueles que ainda vivem nas áreas de conflito e até mesmo nos países vizinhos. Então, infelizmente, eu não vejo melhorar nada.

Esta entrevista foi condensada e editada.

Imagem principal por Sam Berkhead

Fonte: IJNet

Por: Sam berkhead

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