Como entender uma nação que viveu o período ditatorial mais sanguinário da América do Sul,…
Artista mexicana leva exposição feminista à Argentina, onde 93% das mulheres já foram assediadas
[:pb]El Tendedero, de Mónica Mayer, reúne em um varal depoimentos de mulheres vítimas de assédio ao redor do mundo.
FERNANDA PRESTES
JULIA CAMPOS
PAOLA MICHELETTI
DE BUENOS AIRES
“Fui assediada pela primeira vez quando era criança, aos 6 anos”. Esse relato é comum a 93% das mulheres argentinas, que disseram já ter sofrido assédio nas ruas, segundo uma pesquisa da associação Mujeres de la Matria Latinoamericana (MuMaLá). Entre as entrevistadas, 80% também afirmaram não se sentirem seguras andando pela cidade de Buenos Aires. O depoimento faz parte da exposição feminista El Tendedero – ou o varal, em português – da artista mexicana Mónica Mayer, que está na Argentina.
A intervenção consiste na abordagem de mulheres para que respondam, por escrito, algumas perguntas sobre como se deparam com o assédio em suas rotinas. Após responderem aos questionamentos, as pessoas penduram suas experiências no varal de papéis. Entre tantos relatos recolhidos ao longo dos anos, estão denúncias de mulheres assediadas quando ainda eram crianças, que presenciam violência doméstica e convivem diariamente com a misoginia.
O varal foi montado em frente ao El Trapito, em uma pequena esquina do bairro La Boca. Muitas mulheres, homens e crianças paravam e perguntavam do que se tratava a performance, e a artista, pessoalmente, explicava os motivos pelos quais estava ali.
El Tendedero
A primeira edição da intervenção aconteceu em 1978, quando Mónica Mayer foi convidada para uma exposição na Cidade do México, chamada Salão 77/78 – Novas Tendências. “Eu já estava envolvida com arte, evidentemente, e com o feminismo, e a primeira coisa que me ocorreu foi falar com outras mulheres sobre assédio. Não se falava do feminismo na Cidade do México. Então fiz um varal com folhinhas rosas, pedindo para que as mulheres me dissessem o que mais detestavam na cidade. Em muitas ocasiões me disseram que era o trânsito, o lixo, mas eu perguntava ‘Não te incomoda que te agarrem no metrô?’, e muitas diziam ‘Sim, me incomoda’, e eu dizia que era para elas colocarem isso. Começaram a aparecer muitas reclamações sobre assédio”, conta Mayer.
Depois de viajar por diversos estados mexicanos, bem como outros países – Estados Unidos, Colômbia, e agora, na Argentina, a artista calcula já ter recolhido cerca de 15 mil papéis com depoimentos que, boa parte deles, escaneia e coloca em suas redes sociais. “Me surpreende que há muitas mulheres que dizem que nunca sofreram assédio, mas é muito doloroso ler que o primeiro assédio que uma mulher sofreu foi aos cinco anos de idade, aos oito, aos dez”, explica a artista, que diz não ter estrutura emocional para ler alguns dos relatos mais chocantes.
Para Mónica, o público das exposições varia muito de lugar para lugar. O “El Tendedero” passou, na última semana, pelo Museu de Arte Latinoamericana de Buenos Aires (Malba), onde os visitantes tinham tempo para compreender do que se tratava a intervenção. Já no bairro La Boca, a performance foi feita para pessoas que estavam de passagem, muitas vezes sem prestar atenção na intervenção artística.
A artista ainda não tem previsão de ir ao Brasil com a exposição, visto que viaja de acordo com convites. “Se quiserem fazer por lá, posso enviar as instruções. Muitas vezes fazem por conta própria e eu não vou”, sugere.
Mulheres na arte
Quando é convidada para fazer a exposição em algum local, a mexicana Mónica Mayer pede para que outras artistas mulheres também sejam chamadas. Assim, fomenta a participação feminina na arte, seja em apresentações de obras coletivas ou individuais.
De acordo com a organização argentina Nosotras Proponemos, a desigualdade de gênero está presente tanto nas coleções de museus, como nas coleções privadas, prêmios, exposições e feiras de arte. A instituição, que estabeleceu a Assembleia Permanente das Trabalhadoras de Arte em novembro de 2017, reuniu cerca de 3 mil assinaturas de artistas de todo o mundo em prol da defesa da igualdade na arte. Entre as 37 propostas de mudanças, a principal consiste na divisão igualitária entre homens e mulheres no mundo artístico, que atualmente possui apenas 20% de representatividade feminina.
FERNANDA PRESTES, JULIA CAMPOS e PAOLA MICHELETTI são jornalistas e participam do “Jornalismo sem Fronteiras”, que leva jornalistas e estudantes de comunicação a Buenos Aires para um mergulho de 10 dias no trabalho de correspondente internacional.[:en]El Tendedero, de Mónica Mayer, reúne em um varal depoimentos de mulheres vítimas de assédio ao redor do mundo.
“Fui assediada pela primeira vez quando era criança, aos 6 anos”. Esse relato é comum a 93% das mulheres argentinas, que disseram já ter sofrido assédio nas ruas, segundo uma pesquisa da associação Mujeres de la Matria Latinoamericana (MuMaLá). Entre as entrevistadas, 80% também afirmaram não se sentirem seguras andando pela cidade de Buenos Aires. O depoimento faz parte da exposição feminista El Tendedero – ou o varal, em português – da artista mexicana Mónica Mayer, que está na Argentina.
A intervenção consiste na abordagem de mulheres para que respondam, por escrito, algumas perguntas sobre como se deparam com o assédio em suas rotinas. Após responderem aos questionamentos, as pessoas penduram suas experiências no varal de papéis. Entre tantos relatos recolhidos ao longo dos anos, estão denúncias de mulheres assediadas quando ainda eram crianças, que presenciam violência doméstica e convivem diariamente com a misoginia.
O varal foi montado em frente ao El Trapito, em uma pequena esquina do bairro La Boca. Muitas mulheres, homens e crianças paravam e perguntavam do que se tratava a performance, e a artista, pessoalmente, explicava os motivos pelos quais estava ali.
El Tendedero
A primeira edição da intervenção aconteceu em 1978, quando Mónica Mayer foi convidada para uma exposição na Cidade do México, chamada Salão 77/78 – Novas Tendências. “Eu já estava envolvida com arte, evidentemente, e com o feminismo, e a primeira coisa que me ocorreu foi falar com outras mulheres sobre assédio. Não se falava do feminismo na Cidade do México. Então fiz um varal com folhinhas rosas, pedindo para que as mulheres me dissessem o que mais detestavam na cidade. Em muitas ocasiões me disseram que era o trânsito, o lixo, mas eu perguntava ‘Não te incomoda que te agarrem no metrô?’, e muitas diziam ‘Sim, me incomoda’, e eu dizia que era para elas colocarem isso. Começaram a aparecer muitas reclamações sobre assédio”, conta Mayer.
Depois de viajar por diversos estados mexicanos, bem como outros países – Estados Unidos, Colômbia, e agora, na Argentina, a artista calcula já ter recolhido cerca de 15 mil papéis com depoimentos que, boa parte deles, escaneia e coloca em suas redes sociais. “Me surpreende que há muitas mulheres que dizem que nunca sofreram assédio, mas é muito doloroso ler que o primeiro assédio que uma mulher sofreu foi aos cinco anos de idade, aos oito, aos dez”, explica a artista, que diz não ter estrutura emocional para ler alguns dos relatos mais chocantes.
Para Mónica, o público das exposições varia muito de lugar para lugar. O “El Tendedero” passou, na última semana, pelo Museu de Arte Latinoamericana de Buenos Aires (Malba), onde os visitantes tinham tempo para compreender do que se tratava a intervenção. Já no bairro La Boca, a performance foi feita para pessoas que estavam de passagem, muitas vezes sem prestar atenção na intervenção artística.
A artista ainda não tem previsão de ir ao Brasil com a exposição, visto que viaja de acordo com convites. “Se quiserem fazer por lá, posso enviar as instruções. Muitas vezes fazem por conta própria e eu não vou”, sugere.
Mulheres na arte
Quando é convidada para fazer a exposição em algum local, a mexicana Mónica Mayer pede para que outras artistas mulheres também sejam chamadas. Assim, fomenta a participação feminina na arte, seja em apresentações de obras coletivas ou individuais.
De acordo com a organização argentina Nosotras Proponemos, a desigualdade de gênero está presente tanto nas coleções de museus, como nas coleções privadas, prêmios, exposições e feiras de arte. A instituição, que estabeleceu a Assembleia Permanente das Trabalhadoras de Arte em novembro de 2017, reuniu cerca de 3 mil assinaturas de artistas de todo o mundo em prol da defesa da igualdade na arte. Entre as 37 propostas de mudanças, a principal consiste na divisão igualitária entre homens e mulheres no mundo artístico, que atualmente possui apenas 20% de representatividade feminina.
FERNANDA PRESTES, JULIA CAMPOS e PAOLA MICHELETTI são jornalistas e participam do “Jornalismo sem Fronteiras”, que leva jornalistas e estudantes de comunicação a Buenos Aires para um mergulho de 10 dias no trabalho de correspondente internacional.[:]
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