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O dia em que Jean Wyllys me ignorou e Bolsonaro me cumprimentou

BERNARDO GONZAGA, DE BRASÍLIA

Desde as eleições de 2014 a esquerda brasileira vem perdendo espaço no plenário da Câmara. Isso ficou claro quando o partido com maior número de deputados eleitos foi o PSDB, enquanto o PT teve um número bastante reduzido em sua bancada. Além disso, o declínio continuou nas eleições seguintes, a de prefeito e vereador, com o DEM e PSDB tendo mais número de políticos eleitos do que o PSOL e o PT (esse, inclusive, não elegeu nenhum prefeito em segundo turno).

Isso poderia ser facilmente explicado pelo processo de impeachment que a ex presidente Dilma Rousseff viveu no ano de 2016 e pelos consecutivos escândalos de corrupção envolvendo o PT na operação Lava Jato. Além disso, o caso do Mensalão ainda estava muito vivo na memória das pessoas, naquele ano. Mas ainda faltava alguma coisa. Ainda havia algo a ser explicado. Esse buraco negro foi tampado, em parte, através de uma experiência na Câmara dos deputados vivida por esse que vos escreve.

Em um corredor do anexo 3 da Câmara, estava eu andando em direção ao Salão Verde da casa para tentar conseguir uma palavra de algum parlamentar sobre a proposta de emenda constitucional que havia sido votada naquele dia no Senado, a PEC 55, que congela os gastos públicos por 20 anos. Nesse mesmo corredor, logo atrás de mim, vinha andando a passos largos e um olhar compenetrado no celular o deputado Jean Wyllys (PSOL RJ). Como um reflexo de jornalista quando vê a notícia, já fui logo dizendo:“Jean!”, mas não tive tempo de continuar a frase. Ele, sem desgrudar os olhos do aparelho, respondeu dura e secamente: “eu tenho que votar” e continuou andando. Pensei comigo “ossos do ofício” e segui meu trajeto.

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Reprodução Agência Brasil

Quando cheguei ao Salão Verde, onde fica toda a imprensa, me deparo com uma cena pitoresca. Procurando algum parlamentar que penso ser mais aberto, ou talvez mais disposto a falar sobre assunto, vem andando em minha direção o mais polêmico de todos, o que é a favor da pena de morte, redução da maioridade penal e legalização do porte de arma: Jair Bolsonaro. Com todas essas características não imaginei que ele fosse me dar um pingo de atenção e muito menos falar sobre aquela PEC que, de uma hora para outra, ele mudou de opinião a respeito e votou a favor dela. Por isso achei melhor não perguntar para não criar polêmica e não ser expulso de onde estava (afinal, estava ali sem credencial). Porém, para a minha surpresa, o terror dos defensores dos direitos humanos, ao passar do meu lado, abriu um largo sorriso, acenou e ainda disse um “boa tarde”.

Naquele momento eu percebi que, alem de ter perdido um depoimento, valores haviam entrado em choque. O parlamentar que é rotulado como grande defensor de direitos humanos, diversidade cultural e racial ignorou um profissional que tem como função informar as pessoas, e o grande vilão da sociedade se apresentou como um homem disposto, feliz e atencioso. Obviamente que não estou querendo criar um juizo de valor a nenhum dos dois baseado em alguns segundos de convivência, isso daqui é apenas o relato de uma impressão, a mesma que a gente leva para as urnas quando vai escolher o candidato em quem votar.

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