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#NoTeVayasLio

ANDRÉ COSTA BRANCO

Lembro de ter enterrado a cabeça no travesseiro, exausto. Mas antes disso, bem antes disso, antes de fechar a matéria com o Luiz, ansiosos que estávamos para enviá-la a algum veículo de imprensa, lembro de me aproximar, fascinado, daquela multidão apaixonante, que cantava, a despeito da chuva, do frio e da lama.

A relação de um povo com seus ídolos explica toda uma cultura; foi com esta premissa que desembarquei a Buenos Aires: tentar entender o que o povo de Perón, Gardel e Maradona sentia por Lionel Messi.

O craque anunciara sua aposentadoria da seleção argentina, logo após a derrota para o Chile na final da Copa América – em que isolou um pênalti. Dali em diante, irrompeu na imprensa e nas redes sociais uma campanha para que #NoTeVayasLio, que ganhou contornos de política de Estado.

No último sábado, 2, a comoção se derramou nas ruas. Centenas de argentinos tomaram a Praça da República, onde está encrustado o Obelisco, e promoveram um “bandeiraço” em apoio a Messi. Aos olhos de um desavisado, a manifestação poderia parecer a comemoração de um título. Na Argentina, derrotas também podem gerar catarse.
Luiz e eu nos desgarramos do grupo para circular pela multidão e fazer as entrevistas. O guarda-chuva emprestado pelo Victão logo virou artigo dispensável: precisávamos assumir aquela cobertura de cara para o vento. Flanamos por uma boa meia hora, talvez até mais. Às margens, por cima das muretas, o ato era observado com mais cautela. No meio, como um turbilhão centrípeto, era a festa dos hinchas, os apaixonados torcedores argentinos, que pulavam e cantavam por um futebolista que jamais vestiu a camisa de um clube do país. A cena lembrava um ato ecumênico. “Se sofre, se chora, mas nunca se abandona”, sintetizou Brian Moreira, de 23 anos.

Sentamos em um café, reunido todo o grupo, para encaminhar o material da Eunice à Globo News. Lembro de ainda estar energizado, eufórico e ansioso para escrever aquela matéria. O que foi feito no quarto do hotel, com os dedos gelados e a cabeça quente.

A matéria do ato na Praça da República não foi ao ar (vamos aproveitar o material para uma reportagem mais analítica). O instante, porém, não foi perdido. Estar na rua é o pão de cada dia do jornalismo. Essa deve ser a escolha número zero. Na dúvida, veja as coisas acontecerem. Esteja lá. É só assim que das coisas se pode lembrar.

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