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Padre Ángel: o Robin Hood moderno

Aos 79 anos, o fundador e presidente da ONG Mensajeros de la Paz e ganhador do prêmio Príncipe de Asturias de la Concordia tem uma história parecida com a do herói da mitologia inglesa

BEATRIZ AMARO E JOELLI AZEVEDO
DE MADRI

16196153_10154346124662756_660397583_oA Inglaterra do século XIII foi marcada por um personagem sobre o qual se fala até hoje: Robin Hood, um arqueiro conhecido por roubar riquezas dos ricos para dar aos pobres. Todos os dias, Robin Hood abordava os reis e o clero nas florestas e levava suas riquezas para vilarejos próximos, onde dividia as moedas de ouro, tecidos e o que tivesse conseguido.

Pouco se sabe sobre o Robin Hood inglês, mas em Madri, capital da Espanha, sua benevolência inspirou Ángel García a ajudar quem precisa. Padre Ángel, como é conhecido, desenvolve projetos na Iglesia de San Antón, além de presidir a organização não-governamental (ONG) Mensajeros de la Paz, formada por voluntários que assistem crianças, mulheres e adultos vulneráveis e atua em vários lugares do mundo de forma direta ou através de colaborações.

 

 

UMA PROPOSTA DIFERENTE

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A última grande ação de Padre Ángel foi a inauguração do restaurante popular Robin Hood, a poucas ruas da igreja, na Calle Eguilaz, 7. Lá, cerca de 100 pessoas jantam diária e gratuitamente. Durante o dia, o estabelecimento oferece café da manhã e almoço pagos. A refeição custa 11 euros e inclui primeiro e segundo pratos, além de uma bebida. Boa parte dos que frequentam Robin Hood de dia sabem do intuito do restaurante, conhecem Padre Ángel e/ou os que usufruem das refeições gratuitas. O nome, é claro, faz referência ao herói britânico.

“Não há distinção entre o almoço e a janta”, afirma Padre Ángel. “Qualquer um pode comer no restaurante e terá a mesma qualidade.” Apesar de não haver nenhum pré-requisito para o cadastro, é preciso procurar um assistente social da comunidade, um voluntário dos Mensajeros de la Paz ou a própria paróquia. O cadastrado recebe um cartão de controle para que possa fazer a refeição diariamente. O cartão dura 30 dias – ao final deste tempo, o cadastro precisa ser renovado.

As refeições são oferecidas em dois turnos: às 19h30 e às 20h30. O local comporta cerca de 50 pessoas, mas aproximadamente 100 são atendidas por noite. Para Padre Ángel, “o espaço já está ficando pequeno”. A solução será abrir outros dois Robin Hood em Madri, mas há planos de expandir os serviços para outras cidades da Espanha.

No restaurante, o sentimento é de gratidão. Carmen, que está lá todos os dias, explica que o serviço é de grande ajuda, especialmente porque permite que ela economize para investir em remédios para cuidar da saúde. Do outro lado do balcão, os garçons María e Emílio definem o trabalho como “gratificante”. María, que sempre trabalhou como garçonete, afirma que “é a primeira vez que sinto que faço a diferença e que estou ajudando quem precisa”. Para Emílio, “a sensação é de dever cumprido. Além disso, criamos relações de confiança e proximidade com quem vem ao restaurante à noite. São pessoas que estão aqui praticamente todos os dias e das quais ficamos próximos”.

Padre Ángel também visita Robin Hood com assiduidade, mesmo quando a agenda está lotada – e é recebido com sorrisos e abraços. “É importante lhes desejar boa noite e pedir que aproveitem. Gosto de me sentar com todos e conversar. Não há felicidade maior que fazer os outros felizes.”  

 

SÃO PAULO versus MADRID: ASSISTÊNCIA SOCIAL E PROGRAMAS DO GOVERNO

Além de organizações como os Mensajeros de la Paz, a Prefeitura de Madri dispõe de recursos sociais cujo objetivo é acolher e ajudar pessoas desabrigadas: o Samur Social, formado por uma equipe de pessoas que realiza trabalhos sociais diretamente nas ruas; os Centros Abiertos Municipales, que atendem pessoas de 18 a 65 anos e nos quais se oferece zona de descanso, café da manhã, alimentação; os Centros Municipales de Acogida, cujo intuito é oferecer atenção especializada aos moradores de rua através de alojamento, alimentação e higiene personalizadas; e campanhas específicas como a Campaña Municipal contra el Frío, o Programa de Intervención con jóvenes sin hogar e os Pisos de Apoyo al tratamiento para personas sin hogar con problemas de adicción al alcohol.

Para tratar do problema específico da fome, a Prefeitura lançou mão dos Comedores Sociales, serviços que proporcionam comidas e alimentação adequadas a pessoas que não dispõem de meios para tê-lo. Também possibilita o acesso a informações, espaços de relação e orientação social.

No último Recuento Nocturno de Personas sin Hogar, realizado em dezembro de 2014, a Prefeitura de Madrid contabilizou 1.905 pessoas desabrigadas, das quais 764 dormem na rua e 1.141 passam a noite em albergues municipais ou centros de ajuda. O número total representa 0.060% da população – 3.165 milhões de habitantes, à época.

Em São Paulo, uma das maiores e mais importantes cidades do Brasil, os números são parecidos: o Censo de 2015 mostrou que 15.905 pessoas vivem desabrigadas (7.335 na rua e 8.570 acolhidas), ou seja, 0.132% de uma população de aproximadamente 4 milhões de habitantes.

Dentro dos Serviços de Direitos Humanos praticados pela Prefeitura de São Paulo, destaca-se a Abordagem Social às Pessoas em Situação de Rua, serviço cuja finalidade é “assegurar atendimento especializado para apoio, orientação e acompanhamento a famílias com um ou mais de seus membros em situação de ameaça ou violação de direitos”. Além disso, a cidade conta com Centros de Acolhida espalhados por todas as regiões, alguns que funcionam durante 24 horas, outros durante 16 horas diárias. Operações e campanhas pontuais, como a Operação Baixas Temperaturas, também são ações realizadas pela Prefeitura.  

Apesar de não atuarem diretamente no Brasil, os Mensajeros de la Paz mantêm uma parceria com religiosas do País. “Mas não é impossível fazer algo parecido com nosso restaurante ou mesmo abrir um Robin Hood lá”, afirma Padre Ángel. “O que queremos é poder contar com a solidariedade e a generosidade das pessoas – e isso pode ser feito em qualquer lugar.”

 

Joelli Azevedo e Beatriz Amaro são jornalistas e participantes do “Jornalismo sem Fronteiras”, que leva jornalistas e estudantes de comunicação a Madri para um mergulho de 10 dias no trabalho de correspondentes internacionais.

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