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Aires de café

Preocupação com a qualidade, do cultivo à xícara, é o principal ingrediente dos cafés especiais. Os hermanos saem do tradicional e abrem espaço para novas bebidas e cafeterias, que trazem as tendências do mundo cafeeiro e colocam o café em sua merecida posição de protagonista.

ISABELA MORENO

DE BUENOS AIRES

 

Buenos Aires é referência quando o assunto envolve cafés. Caminhando pela cidade, o que não falta na paisagem são charmosas cafeterias, restaurantes e bares que sirvam o tão desejado líquido negro da lucidez. Nos últimos anos, novas versões que fogem ao tradicional surgiram pela capital, trazendo a proposta de uma bebida diferenciada e de alta qualidade.

O surgimento de especialistas, chamados baristas, que não apenas se dedicam ao preparo elaborado e cuidadoso do café, mas também ao processo de torra e criação de blends, impulsionou a curiosidade no consumidor que, com mais informações, passou a exigir uma bebida de melhor qualidade. A sofisticação do consumo através do boom nas vendas de máquinas de espresso e blends de cafés em cápsulas reafirmam o consumidor em um patamar de maior exigência. Em 2011, a Argentina esteve no topo do ranking na venda de máquinas de espresso caseiras.

A responsável pela popularização do consumo de cafés diferenciados e drinks exclusivos, bem como da presença de um barista, foi a gigante Starbucks. O conceito de um lugar onde você pode confortavelmente sentar-se para trabalhar ou encontrar amigos enquanto aprecia um café da intensidade que desejar, com o tipo de leite que preferir e até mesmo adoçado com as mais variadas caldas, contribuiu para a atração de um público mais jovem, que endossou o status “cool” do mundo de cafés gourmets e especiais.

Contudo, nem todo o café consumido é de alta qualidade. Os elevados custos de produção refletem no preço final, fator que distancia parcela dos potenciais consumidores.

Segundo a Câmara Argentina de Café, os hermanos consomem em média 1kg per capita por ano – no Brasil, esse número chegou a 4,9kg per capita em 2015. O país integra o pequeno grupo de nações que ainda permite a mistura dos grãos com açúcar queimado, uma espécie de “trapaça” que, apesar de deixar mais gostoso, pode ser prejudicial para a saúde.

Não há produção industrial  de café na Argentina, principalmente por fatores climáticos – o café necessita de altas temperaturas para o cultivo -, tornando-a uma grande importadora para suprir a demanda interna. De acordo com um estudo de consumo da Câmara Argentina de Café, 63% dos argentinos bebem entre uma e duas xícaras por dia, 16% entre três e quatro, e apenas 3% consomem mais de quatro por dia.

As principais cafeterias de cafés especiais estão por toda a cidade e são acessíveis ao público, com a vantagem de ter à disposição um profissional bem preparado e grãos torrados cuidadosamente.

Muito além do resultado na xícara, a produção de cafés especiais está associada a uma série de medidas que contribuem para a preservação do meio ambiente, valorização da mão de obra e das relações inseridas nessa longa cadeia.

Cafés especiais vem de pequenos cultivos, em regiões com microclimas explicar que produzem grãos complexos, com notas sensoriais diversificadas. Plante uma excelente variedade de café na altitude errada ou no solo errado e qualquer possibilidade de produto de qualidade se esvairá.  

Geralmente, uma família se dedica à fazenda, quase sempre passada por gerações. Cultivar cafés especiais é focar em qualidade, não quantidade. Mas todo o trabalho duro é melhor recompensado: em média, paga-se 40% a mais em uma saca de cafés especiais do que de café commoditie.

Para receber a certificação, é necessário que, na avaliação profissional, o café atinja o valor minimo de 80 pontos – em uma escala que vai até 100 – e não receba nota zero em nenhum dos critérios – bebida limpa, doçura, acidez, corpo, sabor, gosto remanescente e balanço geral. A valorização do preço da saca proporcionou incentivo para a produção de cafés especiais, além de ter melhorado a vida de muitas famílias que vivem da agricultura familiar

sabores café

 

ESTILO BARISTA CAFÉ

Andando pela Recoleta, a Estilo Barista é um pequeno achado. Uma grande janela permite que os passantes espiem para dentro da dentro da charmosa cafeteria, com poucos lugares e estofados feitos de sacas de Café do Brasil. Um espresso acompanhado de muffin de limão com papoula se fez necessário para começar o dia. Servido em uma pequena xícara, os 30 ml da bebida se mostraram rústicos no sabor. Não muito complexo, notas de castanha com toque defumado preenchem a boca, juntamente com um leve azedinho que te fará salivar como se tivesse mordido um morango. 

Por dentro do Estilo Café. Foro por: Isabela Moreno
O doce, o azedo, o amargo. Foto por: Isabela Moreno

 

Me localiza? Cerrito 1224, Recoleta

 

NEGRO CUEVA DE CAFÉ

No Negro, você escolhe para qual região do mundo quer ser transportado. Cafés colombianos, africanos, brasileiros e guatemaltecos preenchem a grande gôndola ao fim da loja. São variadas também as opções de extração: espresso, coado v60 (coador japonês), Chemex, Sifão, French Press e Aeropress. Com tantas possibilidades, o pedido ficou por conta da indicação do barista: café de Burundi (África) feito na Chemex. Delicado e complexo, tem fortes notas de jasmin e doçura que se destaca principalmente no retrogosto. Para acompanhar, mousse de chocolate com framboesa: aveludado e equilibrado entre doçura e acidez, harmonizou perfeitamente com o café. Apesar de ter espaço apertado e viver cheio, o Negro é parada obrigatória para os amantes cafeeiros. Se não quiser enfrentar espera de mesa, peça pela janelinha que dá para a rua e siga pelas charmosíssimas ruas da cidade apreciando um dos melhores cafés da cidade.

Por dentro do Negro. Foto por: Isabela Moreno
O mousse e o amor. Foto por: Isabela Moreno

 

Me localiza? Suipacha, 637

 

COFFEE TOWN SPECIALTY COFFEE ROASTERS

Quando passear pelo famoso mercado de pulgas em San Telmo, não deixe de passar pelo mercado do bairro. Entre iguarias, açougues e especiarias, uma pequena e colorida cafeteria atrai pelo constante aroma de café. A Coffee Town torra, prepara e serve cafés de diferentes cantos do mundo, além de disponibilizar para que o cliente leve o pacotinho de seu grão preferido para casa. O filtrado do blend da casa é encorpado, com sabor amendoado e levemente tostado. Um café que agrada o paladar daqueles que não simpatizam com o azedinho dos cafés especiais. O cheesecake de frutas vermelhas vem com base de cacau e creme mais consistente que o comum, sem deixar a  desejar no sabor.

Coffee Town bem no meio do mercado de San Telmo. Foto por: Isabela Moreno

Me localiza? Bolivar 976, San Telmo

 

NININA BAKERY

Como o próprio nome sugere, Ninina é uma padaria, com os benefícios de uma boa cafeteria. O espaço é amplo e a divisão da cozinha com o salão é feita por uma parede de vidro, permitindo que o cliente veja tudo o que acontece na produção. Pães de fermentação natural, integrais, com frutas e castanhas estampam a vitrine que dá para a rua. A indicação do barista foi o grão da Guatemala coado em v60 e surpreendeu pela complexidade de sabores. Logo no primeiro gole, já é possível sentir notas de doce de laranja, que permanece no retrogosto com sensação de frescor no fundo da garganta. 

A charmosa Ninina. Foto por: Isabela Moreno

Me localiza? Gorriti 4738, Palermo

 

FULL CITY COFFEE HOUSE

Localizado no badalado bairro de Palermo, o Full City Coffee House parece ter saído de um filme hipster americano. Sacas de café são usadas de decoração, trilha sonora com David Bowie e um atendente barbudo e de camisa xadrez. A indicação do barista foi o blend da casa, coado em v60. Pouco complexo e azedinho, tem doçura equilibrada e leves notas herbáceas, que remetem a aspargos cozidos. 

O balcão de filme do Full City. Foto por: Isabela Moreno

Me localiza? Thames 1535, Palermo

 

LAB TOSTADORES DE CAFÉ

Já pelo nome, sabemos que o Lab não é apenas mais uma cafeteria: ali são torrados os grãos servidos na casa. Tudo é milimetricamente testado, medido e provado: a quantidade de café que vai no espresso é pesada em balança de precisão. As várias receitas de cafés – que variam conforme o método de extração – estão na parede da cafeteria para caso alguém se interesse em fazer na própria casa, e são igualmente bem executadas como o espresso. Vale a pena sentar nas confortáveis poltronas de saca de café e assistir ao show de preparo dos baristas. A indicação da vez foi um grão do Congo, preparado pelo método Kalita. Doçura impressionante e pouco azedinho, são evidentes as notas de cacau e capim-limão. 

LAB e seu balcão de métodos de preparo. Foto por: Isabela Moreno

Me localiza? Humboldt 1542, Palermo

 

“Ao melhorar o tratamento que damos ao café, melhoramos as relações humanas que estão inseridas na cadeia da produção ao consumo”.

 

ISABELA MORENO é jornalista e participou do “Jornalismo sem Fronteiras”, que leva jornalistas e estudantes de comunicação a Buenos Aires para um mergulho de 10 dias no trabalho de correspondente internacional.

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